11ª
edição do “Abrace a Serra da Moeda” quer alertar
sobre
esgotamento de nascentes que abastecem Grande BH
Cerca de
10 mil pessoas formarão enorme cordão humano no alto da Serra da Moeda como
forma de defender nascentes da região, que correm risco de secar devido atuação
de empreendimentos e atividades ligadas à exploração do minério e de água.
Todos são convidados a participar. Entrada é gratuita
Será
realizada no feriado de 21 de abril, sábado, a partir das 10h, a 11ª edição do
projeto Abrace a Serra da Moeda, abraço simbólico em prol da preservação da
serra de mesmo nome, localizada em Brumadinho, região metropolitana Belo
Horizonte. O ato público, organizado pela ONG Abrace a Serra da Moeda, deverá
reunir cerca de 10 mil pessoas, entre comunidades locais, autoridades públicas,
ambientalistas, esportistas, grupos culturais e amantes da natureza.
Às 12h em ponto está marcado o momento
mais esperado do evento: todos os participantes, vestidos de branco e com as
mãos dadas, formarão um enorme cordão humano no alto da Serra da Moeda,
conhecida popularmente como “Topo do Mundo”, com um objetivo bastante nobre:
defender as mais de 30 nascentes da região, contidas no Monumento Natural
Municipal da Mãe D’água. Elas servem de abastecimento direto para mais de 10
mil famílias que moram na encosta da Serra, além de serem importantes na
formação das bacias hidrográficas dos rios Paraopeba e Velhas, que distribuem
água para vários municípios da grande BH.
Empresas estão deteriorando nascentes da Serra da Moeda
Segundo
a ONG, embora o mote central desta 11ª edição do Abrace continue sendo a luta
pela criação do Monumento Natural Estadual da Mãe D’água, que visa proteger as
nascentes da região, este ano o protesto também será para exigir da Secretaria
de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD),
responsabilidade com a segurança hídrica da Região Metropolitana de Belo
Horizonte. Isso porque o órgão ambiental estadual vem se posicionando favorável
à viabilidade de empreendimentos que produzem significativos impactos,
especialmente na Serra da Moeda, sem qualquer estudo conclusivo acerca da
viabilidade hídrica dessas atividades.
Fábrica da Coca Cola
Um desses empreendimentos que, segundo
os ambientalistas do Abrace a Serra da Moeda, vem reduzindo drasticamente a
vazão das nascentes da região é a fábrica de refrigerantes da Coca-Cola FEMSA, instalada no município de
Itabirito, às margens da BR-040, em meados de 2015.
Com capacidade para produzir 2,4 milhões de litros
de refrigerantes por dia, a multinacional, localizada em uma estrutura
geológica conhecida como Sinclinal da Moeda, extrai mensalmente 173.253m3 de água dos
mananciais da Serra apenas para atender a demanda da fábrica. Os poços estão situados a poucas centenas de
metros de nascentes que abastecem milhares de pessoas em Brumadinho”, afirma a
presidente da ONG, Maria Cristina Vignolo.
A ambientalista acrescenta que, embora a Coca Cola
tenha passado pelo processo de licenciamento prévio, foi dispensada de elaborar
o Estudo de Impacto Ambiental e Hídrico (EIA/RIMA) de sua fábrica, embora a
atuação da empresa seja considerada de significativo impacto. “Ela
também não realizou estudos hidrogeológicos prévios, que poderiam determinar a
disponibilidade hídrica do empreendimento” alerta.
Para
agravar ainda mais a situação, recentemente a ONG Abrace a Serra da Moeda teve
conhecimento de uma falha grave cometida, há 18 anos, pelo IEF, Instituto Estadual de
Florestas.
Segundo Maria Cristina, a Lei
13.960/2001, votada pela ALMG (Assembleia Legislativa de Minas Gerais) e
promulgada pelo então Governador Itamar Franco, atualizou os limites da APA SUL
RMBH (Área de Proteção Ambiental Sul da Região Metropolitana de Belo
Horizonte), em substituição aos decretos 35624/94 e 37812/96. Nesta
atualização, a área onde, em 2015, foi instalada a fábrica da Coca Cola, em
Itabirito, passou a fazer parte da respectiva unidade de conservação.
Entretanto o IEF só foi incluir a multinacional nos limites da APA SUL, em 6 de
dezembro de 2017. “Se tivéssemos conhecimento de que a Coca Cola estava dentro
desta unidade de conservação, ela deveria ter sido submetida a uma anuência do
Conselho Gestor da APA SUL, antes de começar a operar, para conseguir sua
licença prévia, o que, não foi feito em função da não atualização da base de
dados do IEF”, revela Vignolo.
Essa descoberta levou a ONG a
protocolar, no dia 22 de janeiro deste ano, uma nova denúncia contra a
multinacional, junto ao Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e Secretaria
de Estado de Meio Ambiente. Entretanto nenhum dos órgãos ainda se manifestou
sobre o caso.
Já a Coca Cola alega insistentemente, tanto para a
ONG quanto para o Ministério Público, por meio de estudos hidrogeológicos, (um
deles elaborado pela Schlumberger Water
Services do Brasil), que a
deterioração do aquífero da Serra da Moeda foi provocada unicamente pelo baixo
índice de chuvas na região, entre 2012 e 2016, e que, portanto, não existem evidências técnicas
suficientes de que ela estaria contribuindo para o rebaixamento das nascentes. “Porém, ao auditar
esses estudos, por intermédio do IPT (Instituto Tecnológico de São Paulo), o
Ministério Público já constatou que eles são inconclusivos, principalmente
porque a Coca não fez EIA-RIMA dos poços sobre as nascentes”, destaca o geólogo
Ronald Fleischer, que também é ativista da ONG
Abrace a Serra da Moeda.
População
de Brumadinho sofre com falta d’água
O rebaixamento de nascentes da Serra da Moeda, provocado pela Coca-Cola,
já provoca graves reflexos na população local. Na Comunidade Suzana, em
Brumadinho, os moradores são atendidos por caminhões pipa desde meados de 2016,
devido a redução das vazões da nascente de mesmo nome. “São enviados apenas
dois [caminhões pipa] por dia para atender cerca de 500 famílias, o que é
insuficiente. Às vezes eles nem vem”, denuncia o presidente da Associação de
Captação de Água da Serra (ACAS), Jorge Celes, de 56 anos, acrescentando que a
comunidade tem uma escola com 700 crianças, além de um posto médico que atende
quatro localidades próximas. “Se a nascente esgotar por completo, infelizmente,
esses espaços terão que ser fechados”, alerta.
Para
contornar o problema a ONG Abrace a Serra da Moeda, já apresentou à direção da
Coca-Cola, alternativas locacionais para o abastecimento dos poços que operam na
fábrica. No entanto,
até hoje a tradicional empresa de refrigerantes se nega a estudar o assunto. “Pedimos que as autoridades
públicas tratem esta questão de forma urgente e com respeito aos moradores”,
alerta Maria Cristina, acrescentando que essas nascentes deterioradas
alimentam, inclusive, o Rio Paraopeba, que, por sua vez, é um dos responsáveis
pelo abastecimento da grande BH. “Se elas continuarem sendo comprometidas, cedo
ou tarde a população da capital mineira também vai ter que entrar num esquema
de racionamento, ou seja, a devastação tem efeito dominó”, destaca a
ambientalista.
CSul – Projeto de expansão urbana da RMBH
Outro empreendimento que ameaça o patrimônio
natural contido na Serra da Moeda é um faraônico complexo residencial, o CSul
Lagoa dos Ingleses, que será construído em torno de Alphaville, no município de
Nova Lima. O complexo, que ocupará uma área de 27 milhões de m², com demanda de
mais de 2.300.000 m³ de água por mês, também não apresentou estudos
hidrogeológicos prévios consistentes, que confirmem sua viabilidade ambiental.
Ainda nos relatórios apresentados pela Csul aos
órgãos ambientais só existem dados secundários, conforme levantamento realizado
pela ONG Abrace.
Em seu “Parecer Único”, a
equipe interdisciplinar da Supram Central Metropolitana sugeriu aos Conselhos
da APA Sul e Parque Estadual do Rola Moça o deferimento da Licença Ambiental na
fase de LP (Licença Prévia), para o empreendimento Centralidade Sul, mesmo sem
ter conhecimento da disponibilidade hídrica para o empreendimento, que
demandará 3.231.000 litros de água hora. Em função das ações da ONG Abrace a Serra da Moeda nos conselhos da APA
Sul e do Parque Estadual do Rola Moça, o “Parecer Único” da SUPRAM teve sua
anuência rejeitada e voltou a ser analisado por este órgão. “O resultado dessa
negligência pode causar impactos diretos sobre as nascentes e comprometer não
só o fornecimento de água para as mais de 10 mil famílias que vivem no entorno
da Serra, como também para toda a grande BH”, explica Maria Cristina.
Mineradora Ferrous
Resources do Brasil
Além
da operação da Coca-Cola e do megaempreendimento da CSul, a reativação da Mina
da Serrinha, localizada em Piedade do Paraopeba, pretendida pela empresa
Ferrous Resources do Brasil, provocará o rebaixamento do lençol freático e
consequentemente o esgotamento da nascente Mãe D’água, que está ao lado do
empreendimento. “Isso vai afetar diretamente 10 mil famílias da comunidades
como Córrego Ferreira, Palhanos e Retiro do Chalé”, destaca Vignolo.
Estudos técnicos demonstram ainda que a
mineração trará a degradação da paisagem, instabilidade da encosta da Serra,
poluição sonora, crescimento urbano desordenado, emissão de poeira e colocará
em risco a sobrevivência de espécies de flora endêmicas e de fauna ameaçadas de
extinção.
A Mina da Serrinha afetará também a vida
de pessoas de comunidades do vale do Paraopeba, devido às instalações de alto
impacto ambiental, como pilhas de estéril, bacia de rejeitos, usina de
beneficiamento e mineroduto. “O transporte do minério impactará os prédios
históricos de Piedade do Paraopeba e as estradas municipais, por onde passarão
a circular os caminhões de minério para escoar a produção da mina”, explica a
presidente.
Prevista para iniciar as operações em
2011, até hoje a mineradora não obteve as licenças necessárias para reativar a
mina na Serra da Moeda. “A ONG Abrace a Serra da Moeda descobriu e denunciou
inúmeras irregularidades técnicas e jurídicas que estão nos ajudando a atrasar
o licenciamento da atividade.
A última preocupação dos ambientalistas
é a Deliberação Normativa (DN) Copam
nº217, de 06 de dezembro de 2017, que entrou em vigor em 06 de março de 2018. A
referida (DN) estabelece novos critérios para classificação, segundo o
porte e potencial poluidor, bem como os critérios locacionais a serem
utilizados para definição das modalidades de licenciamento ambiental de
empreendimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais no Estado de
Minas Gerais e dá outras providências. “Por isso, a ONG Abrace a
Serra mantem o monitoramento constante dos processos da empresa”, afirma a
advogada ambientalista da instituição, Beatriz Vignolo.
Data do Abrace a Serra
da Moeda tem justificativa histórica
A
data da 11ª edição do Abrace a Serra da Moeda, 21 de abril, foi escolhida de
forma proposital, já que a Inconfidência Mineira, comemorada neste dia,
simboliza a luta dos mineiros contra a exploração de seus recursos naturais e
as arbitrariedades cometidas pela Coroa Portuguesa no período em que o Brasil
ainda era uma colônia.
Mais
de 13 ônibus sairão das comunidades próximas a Serra da Moeda levando a
população local - vários remanescentes de quilombos - para realizarem o abraço
simbólico no topo da montanha. Haverá ainda diversas manifestações culturais da
região durante o abraço.
A
Organização do protesto pede para que os participantes levem protetor solar e
boné. Haverá distribuição gratuita de água.
Informações
sobre a Serra da Moeda
Localizada no Quadrilátero Ferrífero e
ao sul da cadeia de montanhas do Espinhaço, a Serra da Moeda está a 15 km de
Belo Horizonte. Com 1500 metros de altitude, abriga inúmeras nascentes e uma
vasta biodiversidade. A vertente de Brumadinho, onde se realiza o abraço
simbólico, vem se firmando também como um dos destinos turísticos mais
atraentes nas proximidades da capital mineira. A beleza cênica, altitude,
relevo e a condição climática tornaram o espaço ideal para a prática de
esportes outdoor, como voo livre, mountain bike, cavalgadas e caminhadas. A gastronomia
local também é outro grande atrativo.
Sobre a ONG
Responsável
pelo abraço a Serra da Moeda, protesto realizado anualmente desde 2008, a ONG
Abrace a Serra da Moeda tem se destacado pela defesa das águas e serras de
Minas Gerais. Inicialmente como movimento popular, constitucionalizou-se em
associação civil em 2011.
Como chegar - Topo do
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De BH - Acesso pela BR 040, sentido Rio de Janeiro - Continuar reto após o trevo de Ouro Preto (altura do Alphaville) e pegar a Saída 567 (Inhotim), à direita, subida para o condomínio Retiro do Chalé.